COMPANHIA CINEMATOGRÁFICA VERA CRUZ
HISTÓRIA
O cinema brasileiro às vésperas da Vera Cruz
A produção cinematográfica brasileira nas décadas de 30 e 40 está concentrada sobretudo no Rio de Janeiro. Este período é desolador para o cinema brasileiro. As únicas produções deveram-se a documentários e cineatualidades, sustentada pela lei de obrigatoriedade de exibição dos complementos nacionais.
Com o Estado Novo , o DIP e o DEIP´s dominam a produção de jornais cinematográficos , absorvendo e aniquilando os concorrentes.
Além dos documentários , jornais cinematográficos e um ou outro curta-metragem (comediazinhas, números musicais filmados) temos alguns filmes idealizados por modestos artesãos e jovens sonhadores. Entre 1935 e 1949, ou seja, 15 anos, foram produzidos meia dúzia de filmes.
Apesar de terem sidos produzidos, estes filmes se perdiam em meio a grande massa de filmes estrangeiros que eram exibidos em nossos cinemas. Até a guerra de 1914/18, o domínio fica com a Alemanha, Suécia , Dinamarca, Itália e França; após a guerra , com o enfraquecimento das cinematografias européias , é a vez dos EUA que se instalam é até hoje continuam instalados.
Alguns números ilustrativos: em 1941, foram lançados no Brasil 460 filmes de longa metragem dos quais 4 brasileiros; em 1942, 409 filmes sendo 1 brasileiros; 1943, 362 filmes sendo 6 brasileiros. Em 1953 tivemos 578 filmes lançados sendo 34 brasileiros. Vinte anos depois, em 1973, as proporções alteraram-se ligeiramente em favor do filme brasileiro: os canais de televisão do Rio de Janeiro exibiram 1446 filmes de longa metragem dos quais 10 brasileiros. Em 1974, 1704 filmes foram produzidos sendo 34 brasileiros.
As companhias Cinédia e Atlântida no Rio de Janeiro, apesar de terem produzido uma grande quantidade de filmes, foram rejeitadas pela elite por se tratarem de comédias carnavalescas (chanchadas) com um tom popularesco e vulgar.
O aparecimento da Cia. Cinematográfica Vera Cruz vislumbra a possibilidade de um cinema "verdadeiro", distanciado da "indigência" em que se havia transformado o cinema brasileiro visto do Rio de Janeiro. A Vera Cruz ambicionava realizar filmes de classe e em muito maior número, uma verdadeira "expressão cultural".
Vera Cruz: "Do Planalto Abençoado para as Telas do Mundo"
A idéia de se construir uma Companhia Cinematográfica com os moldes da Vera Cruz partiu sobretudo da burguesia e da intelectualidade paulista. Os clubes de cinema e as revistas que tratavam do assunto despertaram o interesse de Ciccilo Matarazzo, Franco Zampari e todo um grupo de pessoas que haviam participado da criação do Museu de Arte Moderna e do Teatro Brasileiro de Comédia discutiam animadamente a organização de uma companhia produtora de filmes. Ainda uma vez por sugestão de Almeida Salles, Alberto Cavalcanti é convidado a participar do empreendimento. No dia 03 de novembro, no saguão do Museu de Arte Moderna, em meio a um coquetel que reunia artistas, intelectuais e um grupo de bons burgueses paulistas, era assinada a ata de constituição da Companhia Cinematográfica Vera Cruz, de que Alberto Cavalcanti seria o produtor geral.
A primeira fase da Vera Cruz que conta com a direção de Alberto Cavalcanti teve como principais produções Caiçara e Painel. Esses filmes obtiveram um enorme sucesso em todo o país inspirando projetos futuros.
No primeiro ano é feito o primeiro balanço em assembléia da diretoria aumentando o capital das ações, tendo Francisco Matarazzo Sobrinho e Francisco Zampari como os maiores acionistas. Porém os altos custos das próximas produções (Tico-Tico no Fubá, Sai da Frente e Ângela) obrigaram a Companhia a adquirir o primeiro grande empréstimo com o Banco do Estado, demonstrando sua falta de planejamento nos investimentos.
Os noticiários dos jornais começam a denunciar os problemas de produção e comercialização que a Vera Cruz enfrentava: empréstimos bancários, altos custos, desorganização da produção, dificuldade de colocação dos filmes no mercado no exterior, etc. Entretanto os boletins e os comunicados da Companhia desconhecem estes problemas, destacando que a empresa caminha de vento em popa para o seu brilhante futuro.
Embora suas produções fizessem um grande sucesso junto ao público e a crítica especializada, a Vera Cruz sempre trabalhou com recursos financeiros escassos. Tico-Tico no Fubá teve seu lançamento em 22 salas simultaneamente e obteve um sucesso realmente muito grande. Em abril de 1952 o filme Veneno se torna bastante popular sobretudo pela presença de Leonora Amar, atriz conhecida mundialmente por atuar em cinemas mexicanos. Porém o filme de maior reconhecimento internacional foi O Cangaceiro que estreou em 20 de janeiro de 1953 em 24 cinemas. A fita foi indicada para representar o Brasil no Festival de Cannes e ganhou o Primeiro Prêmio Internacional para Fitas de Aventura; o filme foi dirigido por Lima Barreto.
Outros filmes vencedores foram: Sinhá Moça, Leão de Bronze em Veneza, Caiçara em Punta del Leste e Santuário também em Veneza.
A paralisação das atividades da Companhia Cinematográfica Vera Cruz aconteceu em novembro de 1953 surpreendendo a todos que um dia acreditaram neste empreendimento de padrão internacional.
É notável a melhoria técnica na fotografia, na montagem, na cenografia, no som e etc, trazida pela Vera Cruz ao cinema brasileiro. Existe também a opinião de que as produções da Vera Cruz possuíam um caráter artificial ao tratar da realidade brasileira. A preocupação de se produzir cinema com moldes internacionais descaracterizava o nacionalismo do cinema.
Os maiores problemas enfrentados foram a lentidão da comercialização dos filmes e o desinteresse das distribuidoras norte-americanas (Columbia) em patrocinar a produção nacional.
Fonte:
• RAMOS, Fernão (org.), "História do cinema brasileiro", Art Editora, 1987
• GALVÃO, Maria Rita, "Burguesia e cinema: o caso Vera Cruz", Editora Civilização Brasileira Embrafilme, 1981.
• GOMES, Paulo Emílio Sales, "Cinema: trajetória no subdesenvolvimento", Editora Paz e Terra, 1980.